memória de pedra

Me lembro de quando eu era só oscilações no horizonte, sombra negra, em princípio indecisa; mas logo fui tomando formas distintas, retraçando meu próprio vulto enorme de monstro e estendendo-me sobre as águas, tornando-me então a Gávea. Rugia corna uma cratera, vomitava fumo, devorava o espaço com meus flancos chispantes. Me lembro do cataclisma primordial. … Continue reading memória de pedra

as coisas do mundo

tem coisas que nem sequer os maiores poetas ousaram escrever; ainda tem outras coisas que a gente sente e não sabe explicar; ainda tem aquelas coisas pequeninas que são tão profundamente grandes que não cabem em nenhuma palavra; e outroras coisas gigantes que extrapolam a função do verbo e pousam ali, leves como uma pluma … Continue reading as coisas do mundo

um texto porrada tipo terapia sugerido pelo meu amigo Ricardo

O script: duas mulheres se encontram em um café. A primeira confronta a segunda sobre uma sequência de mensagens lidas (na privacidade do outro). A segunda se defende e diz que não sabia outro jeito de se comunicar com esse outro (o amor: antigo, já presente da primeira). A primeira acata mas não se convence … Continue reading um texto porrada tipo terapia sugerido pelo meu amigo Ricardo

um trajeto pela praia dos fundos

não sei se posso chamar de praia o lugar insólito em que me encontro agora. estão as margens carcomidas pela água, que é escura e bate suavemente com suas ondulações espumosas - espuma bacteriana que não lembra espuma de barbear muito menos sabão, mas nuvens turvas no vindar da chuva; está também o assoalho arenoso … Continue reading um trajeto pela praia dos fundos

me despedindo da corporação, me encontrando no mundo

é verdade que meus tempos na PalimpsestoBr acabaram. minha mãe ficou preocupada por entender que seria difícil, em tempos como os de hoje, de eu encontrar outra fonte de renda estável dada minha profissão tão específica (talvez ela tivesse pensado também em desvalorizada). não temos mais árvores, mas temos o digital, e cada vez mais … Continue reading me despedindo da corporação, me encontrando no mundo

o dia em que a rua virou dançante e todo mundo voltou a se falar

foi um longo processo, esse do distanciamento, da pausa na vida como um todo, como música que trava na vitrola, e então esse vazio que nos preencheu, nos cercou de eco morto, gente morta, pouco ou quase nada de trabalho, demissões e papéis vazios, solidão. me senti muito sozinha longe das palavras. o trânsito que … Continue reading o dia em que a rua virou dançante e todo mundo voltou a se falar

éticas do coração

um manuscrito contendo todas as informações, estratégias e saídas para as resoluções do coração um dia me foi entregue em mãos por um agente da PalimpsestosBr, daquele jeito desajeitado e preguiçoso que reafirma a imagem dos funcionários públicos país afora. jogou em cima da minha mesa como se me entregasse um calhamaço de currículos qualquer … Continue reading éticas do coração

o dia em que a demanda por palimpsestos aumentou drásticamente

Recuperei, em um almoço de família, uma carta que enviei à minha mãe no meio da quarentena que aconteceu no ano de 2020. Seguem os pensamentos da época: Mãe, são quase uma da manhã, é sexta, penso que tudo bem não trabalhar amanhã, posso me dar um dia de folga. O que você acha dessa … Continue reading o dia em que a demanda por palimpsestos aumentou drásticamente